27 jul Sementes, a fonte da vida?
Há 100 mil anos o homem começou a se aventurar na arte de cultivar a terra. Pôde-se assentar em um lugar, se estabilizar e parar de viver em busca de alimento. Deixou de ser coletor do que a natureza dá para semear, plantar, cultivar e produzir junto com ela seu próprio alimento. Ao redor do globo, cada povo desenvolveu suas técnicas e os alimentos de acordo com o meio ambiente ao seu entorno. Na África do Norte e Europa, o grão base da alimentação foi o trigo, na Ásia o arroz e a soja, e por aqui, nas Américas, a base alimentar foi o nosso amado milho. Ao longo de milhares de anos, as sementes desses grãos evoluíram, adaptando-se colheita após colheita às necessidades local. Assim, em cada safra, agricultores guardaram as sementes das melhores plantas e foram sendo desenvolvidas o que hoje chamamos de sementes crioulas, sementes nativas e locais, que estão adaptadas às intempéries climáticas e ambientais de determinado ecossistema. Essas sementes significam a garantia que determinada população não ficará sem alimento, é a autonomia e soberania alimentar de um povo, comunidade.
Infelizmente, depois do inicio do século XX , 75% das variedades de leguminosas, frutas e
cereais desapareceram, levando com elas culturas alimentares e patrimônio genético construído através de milhares de anos. Atualmente, cultivamos somente entre 150 a 200 espécies vegetais comestíveis contra 250 mil a 300 mil conhecidas, e, dentre as cultivadas, 60% de calorias e proteínas vegetais consumidas pela população mundial vêm apenas de três delas: arroz, milho e trigo.
E, nesse momento nos perguntamos por que esse abandono do cultivo das sementes nativas ?
A explicação está no inicio dos anos 1900, quando colecionadores e pesquisadores franceses de sementes começaram a desenvolver variedades através de cruzamentos genéticos direcionados para um resultado excepcional em função de clima e solo. A partir daí, essas sementes foram uniformizadas, patenteadas e vendidas como uma alternativa que garantiria uma safra sem perdas. Após a II Guerra Mundial, a indústria das sementes ganhou força e foi se espalhando pelo mundo todo dando início à Revolução Verde no campo. Com a promessa de acabar com a fome mundial, ao longo do tempo ela se mostrou ineficiente e insustentável, trazendo mais perdas do que benefícios.
E, como não poderia ser diferente, nosso milho entrou na mira da comercialização das
sementes. Hoje, praticamente 90% do milho cultivado no mundo é de origem de sementes industrializadas híbridas ou transgênicas, o que implica em termos um alimento com alto nível de agrotóxico, em perda de biodiversidade genética, e
em perda de autonomia dos povos, uma vez que sementes industrializadas não se reproduzem nem podem ser guardadas para a próxima safra. Há que se comprar sempre, ou seja, um pacote que nos garante uma safra espetacular, porém traz com ela doenças e degradação ambiental elevadíssimas.
Atualmente três multinacionais controlam 60% das sementes no mundo todo, 80% das sementes comercializadas são híbridas e apenas 15% das sementes crioulas estão guardadas em bancos de sementes internacionais.
Uma triste história que precisa urgentemente ser revertida para a garantia da autonomia, soberania e segurança alimentar das atuais e próximas gerações.
Faço um convite a todos os amantes das Festas Juninas e das delícias feitas com nosso amado milho: Que procurem alternativas para seu consumo! E como se pode fazer isso? Procure contactar os pequenos produtores agroecológicos e orgânicos locais e, compre os milhos produzidos por eles. E, caso não os encontre, realize um pequeno ato de resistência e crie novas receitas para o São João sem milho.
Caso queira saber mais em como fazer sua Festa Junina Livre de Transgênicos, entre
no site do Slow Food Brasil e tenha mais informações sobre a campanha.
Até mais, deliciosos afetos juninos!
Carol Sá
@chefcarolsa
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